31 de julho de 2014

Conto inédito de Nina Rizzi

imagem de J.Lee


CORRESPONDÊNCIAS NA ILHA DE MOREL

Francine escreve a Morel:

e fiquei. a esperar teus postais do sri lanka. me deitei no chão da cozinha e fiquei. a escutar o motor da geladeira e o remelexo das escovas de dentes (você não sabia, mas eu tenho várias. de mania, sei lá o porquê. como tantas coisas, simplesmente é, sem que ter ou saber o porquê.), da merda da prednisolona que me incha e o liquidificador de leites que não bebo e o álcool que não me move e os porta-retratos de imagens que nada me dizem e a tinta lilás de dias mais generosos. e a comida do gato. tudo motorizando.

e em noites ainda mais quentes e úmidas eu me sentava lá em cima da tremitante-geladeira de pernas abertas e as suas eram de pau. assim te cria, louca. louco. turbilhão do motor-nos.
e fiquei. a olhar pro telhado barato-lodoso feito nas coxas. umas grossas outras nem isso. a fiação que me mete medo, elétrica que sou. chocada de teias de aranhas que afasta visitas e teus postais que não me chegam do sri lanka.

você queria minha calma. pronto, taê. me construiu pr’além platonismo. sou matéria calma. MENTIRA, porra! eu continuo (n)a mesma. espalhada entre modernismos, pensamentos complexos, marxismos, blues, choro, o empreguinho de vilanias e a carne fremitante-tanto de te esperar.

eu tentei te ligar. eu queria tão-desesperadamente falar com você que meus dedos tremiam teus números. fumei os vinte cigarros com o telefone na boca. com os dedos arrancados dentes. mas eu não sei nada dos teus números.

e não tem esse negócio de mulherzinha-decadente, não. não tem nada de nada, porque é um tudo indissociável. miscigenar calar correr deitar beber me jogar ao mar. e começar tudo de novo os cabelos presos a tez branca a polidez o amarelo riso. o infindo meio-ser. quiçá a meio-coisa

eu iria ver as magrelas. e me inspirar nelas. você disse. disse que cuidaria disso. de nos querer erguidos-juntos com toda fé em porra nenhuma. se abraçou de vez às mulatas que não são hipotéticas. desencantou da minha falsa branquidez patética. de novo. eu penso que elas são lindas. nossa cabeça é tão cheia que não podemos simplesmente fazer caber as merdas da teletela. é muita cultura pra dois serezinhos, macho. isso pode acabar com a gente. de broxa mesmo. de distopia. então elas são lindas e há também as brancas e rijas e eu até gozava de te ter assim livre, desde que você existisse em si de algum modo. em si e não dos meus tijolos. de mim só a tua carne materialista.

mas eu não vi nada disso. que teus postais não me chegaram do sri lanka. a minha bagagem, imaterial, vazia. e fiquei.

Morel habla com Ella, Faustine:

Y quedó.

Quedó volviendo hacia sí con los dientes marcando sus labios y la sangre brotando del bolsón de rabia que portaba a cuestas.

Bordeaba, en la angosta ladera, un edificio gélido como el filo inaudible de los cortantes acerados y quedó con el choque rebotando en los muros de cemento.

Devolvió las miradas retrospectivas y los deseos envueltos en papel de regalo con multicolores cintas mientras sentía una lluvia de latón cuadrándole la mirada.

Y quedó.

Quedó con su poliédrica visión.

Cuatro o cinco puntas clavaron las ariscas posibilidades del encuentro marcándole las imposibilidades nacidas de las tantas distancias, los pocos tiempos y las solitarias pero multitudinarias diacronías subsiguientes.

Y quedó.

Quedó aunque cayera una tarde demasiado plomiza a sus espaldas y por delante encontrara un reclamo…o quizás varios, para ser más exactos si es que sumamos los propios sin contar los ajenos. Inesperados.

Eso: quedó inesperado.

Se sintió como una red que cazaba vida al enfrascar la salida de una pequeña borboleta…bueno…. mariposa en su propio idioma, pero naturaleza alada al fin.

Y quedó.

Quedó como un carcelero.

Le corrió el signo de una crueldad que no quería ni para sí, ni para la desesperada sangre de la amada que corría a torrentes por los desbordados pasillos de sus sienes.

Y empezaron las preguntas.

Y quedó…con las suyas y las otras.

La mente cocinando, esperando tiempos dilatados, los posibles deseos…. postergados.

Y quedó.

Ahora ella quedó enfrascada aleteando sin percibir que, por arriba, estaba su salida.

No vió el cielo azul que la coronaba ni se pudo quedar, inmóvil, sintiendo esa brisa que susurraba lo que no fue dicho y que es lo que falta en esa terrible noche de las esperas.

La ganó su carne trepitante y se dejó llevar por la propia calentura.

Ella dijo: ¡Porra! Eu continuo (n) a mesma espalhada entre modernismos, pensamentos complexos, marxismos, blues, choro, o empreguinho de vilanias

No puedo ver que no habría, nunca, postales de Sri Lanaka porque él estaba en Hiroshima, mon amour, y en el preciso instante de caer la bomba.

Y quedó.

Quedó abombado.

Fueron dos minutos o mejor digamos una eternidad el estruendo.

¿Qué cosa fuera aquello que los salvaría?

Se preguntó:

¿Qué decir desde Sri Lanka, si ni tiempo le han dado a correr…a llegar hasta otro espacio?

Y quedó.

Quedó esta vez repreguntando... se.


*Nina Rizzi (SP, 1983), escritora historiadora e tradutora. Tem textos, traduções e poemas em diversas antologias, revistas e suplementos; publicou tambores pra n'zinga (poesia; Orpheu, 2012), caderno-goiabada (prosa-ensaística; Edições Ellenismos); Susana Thénon: Habitante do Nada (tradução; Edições Ellenismos, 2013) e A Duração do Deserto (poesia; Patuá, 2014). Atualmente prepara duas publicações em tradução e um livro infantil.